Blog da Editora Advaita com textos de dialogos com Sri Nisargadatta Maharaj e outros Mestres como Sri Ramana Maharshi, Jean Klein, Ramesh Balsekar, Tony Parsons, Karl Renz e outros. Não-dualidade. Para encomendar o livro "Eu Sou Aquilo" Tat Twam Asi - Conversações com Sri Nisargadatta Maharaj" escrever para editora.advaita@gmail.com

sábado, 13 de julho de 2013

Ausência total do agente











   Entre os visitantes, uma manhã, estava um professor de filosofia do norte da Índia. Ele já havia visitado o Maharaj diversas vezes. Naquela manhã, ele estava acompanhado por um de seus amigos, um artista notável mas aparentemente não particularmente interessado no assunto tratado por Maharaj.
          O professor começou a discussão. Disse que estava tão impressionado com aquilo que Maharaj lhe havia dito durante sua última visita que, cada vez que pensava sobre o assunto, sentia surgir vibrações por todo o corpo. Maharaj lhe havia dito que a única ‘maneira’ de regressar era o caminho pelo qual havia chegado, e que não havia nenhum outro. Essa sentença, disse o professor, tocou profundamente uma corda dentro dele, não deixando mais espaço para dúvidas ou questionamentos.
Mas, subseqüentemente, quando começou a pensar com maior profundidade sobre o assunto, especialmente sobre o ‘como’, havia se embaraçado irremediavelmente numa horrível desordem de idéias e conceitos. Ele disse que se sentiu como um homem que tinha recebido como presente um diamante precioso e que mais tarde o havia perdido. O que ele devia fazer agora?
          Maharaj começou falando suavemente. Ele disse: Por favor, entenda. Nenhuma verdade permanece como verdade no momento em que lhe é dada expressão. Ela se torna um conceito! Acrescente a isto o fato de que, para comunicar-se um com o outro, as palavras ‘eu’ e ‘você’, ‘nós’ e ‘eles’ deverão, necessariamente, ser usadas. Assim, o próprio primeiro pensamento quebra a unicidade e cria a dualidade; de fato, é apenas na dualidade que a comunicação pode acontecer. As próprias palavras estendem mais a dicotomia. Mas isto não é tudo. Mais tarde, o ouvinte, em vez de perceber direta e intuitivamente o que está sendo comunicado, começa o processo do pensamento relativo com suas limitações implícitas quando aplicado ao subjetivo e ao numênico.
           Você me acompanhou até aqui? – perguntou o Maharaj – e, então, continuou. O que é o pensamento relativo? É o processo do pensamento por meio do qual um sujeito cria em sua consciência objetos com qualidades ou características opostas que podem ser comparadas. Em outras palavras, o processo não pode funcionar exceto se tiver como base uma dualidade sujeito-objeto. Tal processo de pensamento relativo pode ser competente e, sem dúvida, necessário, para descrever objetos por comparação. Mas, como poderia funcionar com o subjetivo? Aquele que concebe – o sujeito – não pode, obviamente, conceber a si mesmo como um objeto! O olho pode ver tudo exceto a si mesmo!
           Não seria surpreendente, portanto, disse Maharaj, que você tenha se atolado no lodaçal das idéias e conceitos do qual você acha impossível desembaraçar-se? Se você pudesse perceber a situação real, veria quão irônico é isto!
          Estes são os fundamentos. Agora, o problema real: Quem é esse ‘você’ que está tentando fazer voltar pelo caminho que veio? Não importa quanto voltar atrás seguindo sua sombra, ela sempre o antecederá. O que quer dizer voltar atrás? Significa voltar para a posição na qual havia uma ausência total de consciência. Mas – e este é o ponto fundamental da questão – enquanto houver um negador que continue negando e negando (perseguindo a sombra), ‘você’ permanecerá sem negar-se. Tente aperceber-se do que estou dizendo, não com seu intelecto, não como ‘você’ usando seu intelecto, mas apenas como a apercepção em si.
          Pergunto-me se me fiz claro, disse Maharaj.
          Apenas então aconteceu de eu olhar para o amigo artista do professor e fiquei impressionado com a intensidade de sua concentração. Em vez de estar entediado, ou apenas indulgentemente interessado, ele estava escutando cada palavra de Maharaj como se estivesse hipnotizado. Maharaj também devia ter percebido isto, pois sorriu para ele, e o artista, sem dizer uma palavra, juntou as mãos em saudação e acenou sua cabeça diversas vezes em um gesto de comunhão silenciosa.
          O professor, contudo, parecia ter chegado a uma obstrução mental, um bloqueio impenetrável, e assim o disse. Maharaj, então, disse-lhe que esse ‘bloqueio’ era uma obstrução imaginária causada por um ‘você’ imaginário, o qual tinha se identificado com o corpo. Ele disse: Eu repito, deve existir uma negação total e final de modo que o próprio negador desapareça! O que você está tentado fazer é entender o que você é por meio de um conceito da ‘existência’, enquanto, na realidade, ‘Eu’ (você) nem sou, nem não sou, ‘Eu’ está além do próprio conceito de existência, além do próprio conceito de presença positiva ou negativa. A menos que isto seja entendido muito profundamente, você continuará a criar suas próprias obstruções imaginárias, cada uma mais poderosa que a anterior. O que você está tentando encontrar é o que você já é.
          O professor perguntou então: Isto significa, então, que ninguém pode levar-me de volta ao que eu sou? Maharaj confirmou que, de fato, assim era. Você está – sempre tem estado – onde quer ser levado. Na realidade, não há um ‘onde’ para o qual você possa ser levado. A Consciência desta posição óbvia é a resposta – apenas a apercepção; nada a ser feito. E a ironia trágica é que tal Consciência e apercepção não pode ser um ato de volição. Seu estado de vigília se produz por si mesmo, ou você desperta como um ato de volição? De fato, o menor esforço de ‘sua’ parte impedirá o que, de outra forma, poderia acontecer natural e espontaneamente. E o cúmulo da ironia é que seu deliberado não fazer nada também o impedirá de acontecer! É realmente simples; ‘fazer’ algo e ‘não fazer’ algo são esforços volitivos. Deve existir uma ausência total do ‘fazedor’, a ausência total dos aspectos tanto positivos quanto negativos do ‘fazer’. De fato, esta é a verdadeira ‘entrega’.
          Quando, no fim da sessão, o professor e seu amigo artista saiam, Maharaj sorriu para o artista e perguntou-lhe se voltaria novamente. O artista ofereceu seus respeitos muito humildemente, sorriu e disse que ele não poderia deixar de fazê-lo, e eu me perguntei quem havia sido beneficiado pela conversa daquela manhã, o professor efetivamente articulado com sua intelectualidade erudita ou o artista passivo e receptivo com sua percepção sensível.


"Sinais do Absoluto" Pointers from Nisargadatta Maharaj







Nenhum comentário:

Followers

Contador

Pesquisar este blog

visitantes