Pergunta: Eu tenho a sensação de que estou começando a despertar devagar, pouco a pouco.
Karl: Impossível! Neste eterno agora há apenas a experiência do puro eu. Não há, absolutamente, nenhum sentido de “mais ou menos”. Não há “mais próximo” a isto, ou mais avançado, ou menos avançado, ou seja o que for. A iluminação ou a não iluminação é de ninguém. Qualquer ideia de despertar desapareceu. Não há mais ninguém dormindo e ninguém desperto, não há mais toda esta tapeação de tentar chegar a algum lugar, ou ter experiências especiais, ou qualquer outro de tais absurdos. Onde estou ninguém pode estar. Não há ninguém desperto e ninguém adormecido, porque isto que existe nunca dormiu e, portanto, nunca poderá despertar. Cada despertar pessoal é uma piada – um peido no vento.
Uma pessoa nunca pode despertar. O Eu está sempre desperto.
P: Você diz que é absurdo se alguém fala que agora está realizado ou iluminado.
K: A única coisa que se pode dizer é que não há mais nenhuma história pessoal. Esta história, a qual parecia tão real antes, desapareceu. Mas uma pessoa nunca poderá dizer: “Estou iluminado agora”. O que quer que aconteça no tempo não pode transformá-lo no que você já é. O Eu se torna consciente de ‘si Mesmo’ e não depende da pessoa. Isto ocorre espontaneamente, não por causa de algum evento no tempo.
P: Há ainda então uma pessoa?
K: Sim, por exemplo, Ramana disse: “Como Consciência, sou a Consciência absoluta; como consciência, sou a absoluta consciência, e como homem, sou o homem absoluto”.
Jesus disse a mesma coisa. Quando a relatividade está presente, o Eu não está perdido. Aquilo que vive o ser humano é esta mesma existência sempre presente.
P: E eu sou um aspecto daquilo?
K: Um aspecto é fugaz. Cheque se você é algo fugaz ou algo que é. Um aspecto é simplesmente um ângulo de algo, apenas uma reflexão passageira do que você é. Você é o absoluto manifestando-se como um ser humano, como a lua, como o sol, como todo o universo. Você é a própria realidade. Quer você perceba a si mesmo como um ser humano, como uma pedra ou como uma árvore, você é a verdade, a realidade.
P: Então não preciso me esforçar pela iluminação.
K: “Esforçar-se pela iluminação” significa que alguma coisa que é um objeto pensa que poderia fazer algo para aquilo que é a existência absoluta. Ele pensa que precisa mudar algo para que o estado absoluto possa surgir. Deste modo, aquilo que é perfeito pode se tornar um pouco mais perfeito! Mas, quando Ramana disse: “Seja o que você é”, simplesmente quis dizer: “Seja esta existência absoluta, seja aquilo que você não pode não ser”, e que os detalhes sigam seus próprios destinos.
P: Mas, aparentemente, é possível trabalhar em direção a este momento de “Ser o que você é”.
K: Sim. Nisargadatta disse: “Houve tempos nos quais eu existia e, assim, povoei o mundo. Houve tempos nos quais eu e os seres humanos ainda existíamos. Mas desde que este aqui não existe mais, tampouco existe a população. Desde então, o mundo está vazio.” Assim parece que houve tempos nos quais ele viveu na ilusão de que existia como um ser separado entre outros seres separados. Ele acreditou nisto, e embora possa ter sido uma ilusão, parecia ser real. Afinal de contas, quando uma ideia é percebida, ela parece verdadeira. É apenas quando ela é descoberta como falsa que a ilusão explode. Neste momento de claridade, nunca houve um antes ou depois. Não há tempo para isto que você é.
P: Como isto me ajuda na vida diária?
K: Por ver simplesmente que nunca houve alguém que pudesse mudar alguma coisa. Por ver a perfeição no estado comum de você mesmo, torna-se claro que tal estado não é mais ordinário que o eterno AGORA sem vir e ir. Apenas olhe para dentro de você mesmo. Esta é a visão de Deus. Nas palavras de Meister Eckhart: “O olho de Deus que olha no olho de Deus”.
P: Bem, Meister Eckhart, não tive esta percepção.
K: Você nunca tem nada e nunca terá nada. Mas, no momento desta percepção, você vê que é como sempre tem sido. Então não há mais antes ou depois. E isto e sem esforço. Nada precisa ser feito e nada precisa mudar. Nada tem que ir, nada tem que vir. Nem mesmo necessita ser entendido.
P: Então, estou aliviado.
K: Eu também!
De: "A miragem da iluminação" - dialogos com Karl Renz
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