Blog da Editora Advaita com textos de dialogos com Sri Nisargadatta Maharaj e outros Mestres como Sri Ramana Maharshi, Jean Klein, Ramesh Balsekar, Tony Parsons, Karl Renz e outros. Não-dualidade. Para encomendar o livro "Eu Sou Aquilo" Tat Twam Asi - Conversações com Sri Nisargadatta Maharaj" escrever para editora.advaita@gmail.com

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

A Consciência de Ser é Felicidade





Pergunta: Sou médico de profissão. Comecei com cirurgia, continuei com psiquiatria e também escrevi alguns livros sobre a saúde mental e a cura pela fé. Venho a você para aprender as leis da saúde espiritual.

Maharaj: Quando você tenta curar um paciente, o que tenta curar exatamente? O que é a cura? Quando você pode dizer que o homem está curado?

P: Eu procuro curar o corpo assim como melhorar a ligação entre o corpo e a mente. Também procuro colocar a mente em ordem.

M: Você investigou a conexão entre a mente e o corpo? A que ponto eles estão conectados?

P: A mente está entre o corpo e a consciência que o habita.

M: O corpo não é feito de alimentos?  E pode existir uma mente sem alimento?

P: O corpo é construído e mantido pelo alimento. Sem alimento, a mente usualmente fica fraca. Mas a mente não é mero alimento. Há um fator transformador que cria a mente no corpo. O que é este fator transformador?

M: Assim como a madeira produz fogo que não é madeira, o corpo produz a mente que não é corpo. Mas a quem aparece a mente? Quem é o percebedor dos pensamentos e sentimentos que você denomina mente? Há madeira, há fogo e há o desfrutador do fogo. Quem aprecia a mente? O desfrutador é também um resultado do alimento, ou é independente?

P: O percebedor é independente.

M: Como você sabe? Fale de sua própria experiência. Você não é nem o corpo nem a mente.        Você diz assim. Como você sabe?

P: Eu realmente não sei. Suponho que seja assim.

M: A verdade é permanente. O real é imutável. O que muda não é real, o que é real não muda. Agora, que há em você que não muda? Enquanto há alimento, há corpo e mente. Quando termina o alimento, o corpo morre e a mente se dissolve. Mas, o observador morre?

P: Suponho que não. Mas não tenho provas.

M: Você mesmo é a prova. Você não tem, nem pode ter, qualquer outra prova. Você é você mesmo, conhece a si mesmo, ama a si mesmo. Qualquer coisa que a mente fizer, fará pelo amor a seu próprio eu. A própria natureza do eu é amor. O eu é amado, amoroso e cativante. O eu é que faz o corpo e a mente tão interessantes, tão queridos. A própria atenção dada a eles vem do eu.

P: Se o eu não é o corpo nem a mente, pode existir sem eles?

M: Sim, pode. Que o eu tenha existência independente do corpo e da mente é questão de experiência real. Ele é ser-consciência-felicidade (Sat-chit-ananda). A Consciência de ser é felicidade.

P: Para você pode ser uma questão de experiência real, mas não é o meu caso. Como chegar à mesma experiência? Que práticas devo seguir, que exercícios devo começar a me dedicar?

M: Para saber que você não é nem o corpo nem a mente, observe-se com firmeza e viva sem deixar-se afetar por eles, completamente indiferente, como se você estivesse morto. Isto significa que você não tem interesse pessoal nem no corpo nem na mente.

P: Perigoso!

M: Não lhe estou pedindo que se suicide. Nem você pode. Você pode apenas matar o corpo, não pode deter o processo mental, nem pode acabar com a pessoa que você acredita ser. Apenas permaneça impassível. Esta completa indiferença, desinteressado do corpo e da mente, é a melhor prova de que, no âmago de seu ser, você não é nem a mente nem o corpo. O que acontece com o corpo e com a mente pode não estar dentro de seu poder mudar, mas você pode sempre colocar um fim à imaginação de si mesmo como corpo e mente. Aconteça o que acontecer, lembre-se de que apenas o corpo e a mente são afetados, não você mesmo. Quanto mais sério for em lembrar o que necessita ser lembrado, mais rapidamente será consciente de si mesmo como é, pois a memória se converterá em experiência. A seriedade revela o ser. O imaginado e o desejado se convertem no real – aqui está o perigo, assim como a saída.
   Diga-me, que passos você empregou para separar seu eu real – o qual é imutável em você – de seu corpo e de sua mente?

P: Sou médico, estudei muito, impus-me uma estrita disciplina baseada em exercícios e jejuns periódicos, e sou um vegetariano.

M: Mas o que quer no fundo de seu coração?

P: Quero encontrar a realidade.

M: Que preço está disposto a pagar pela realidade? Qualquer preço?

P: Enquanto em teoria estou disposto a pagar qualquer preço, na vida real me sinto impulsionado repetidamente a comportar-me nos modos que se interpõem entre mim e a realidade. O desejo me leva para longe.

M: Aumente e amplie seus desejos até que nada os possa satisfazer exceto a realidade. Não é o desejo que está errado, mas sua estreiteza e pequenez. O desejo é devoção. Sem dúvida, seja devotado ao real, ao infinito, ao eterno coração do ser. Transforme o desejo em amor. Tudo o que você quer é ser feliz. Todos os seus desejos, quaisquer que sejam, são expressões de sua ânsia de felicidade. Basicamente, você tem boa vontade consigo mesmo.

P: Sei que não devo...

M: Espere! Quem lhe disse que não deve? Que está errado em querer ser feliz?

P: O eu deve ir, eu sei.

M: Mas o eu existe. Seus desejos existem. Sua ânsia de felicidade existe. Por quê? Porque você ama a si mesmo. Sem dúvida, ame-se – sabiamente. O incorreto é amar-se estupidamente até o ponto de se fazer sofrer. Ame-se sabiamente. A indulgência e a austeridade têm o mesmo propósito em vista – torná-lo feliz. A indulgência é o modo estúpido e a austeridade é o modo sábio.

P: Que é austeridade?

M: Austeridade é não voltar a passar por uma experiência uma vez que já tenha passado por ela. Austeridade é evitar o desnecessário, é não antecipar a dor ou o prazer. Austeridade é ter as coisas controladas todo o tempo. O desejo por si mesmo não é incorreto. É a própria vida, o impulso de crescer em conhecimento e experiência.
    As escolhas que você faz é que estão erradas. Imaginar que coisas pequenas o farão feliz – alimento, sexo, poder, fama – é enganar a si mesmo. Só algo tão vasto e profundo como o seu eu real pode fazê-lo verdadeiramente feliz de modo duradouro.

P: Já que não há nada basicamente errado no desejo como expressão do amor ao eu, como deveria controlá-lo?

M: Viva sua vida inteligentemente, com os interesses de seu eu mais profundo sempre em mente. Afinal de contas, o que você realmente quer? Perfeição não; você já é perfeito. O que busca é expressar na ação o que você é. Para isto tem um corpo e uma mente. Controle-os e faça-os servir a você.

P: Quem é o operador aqui? Quem deve controlar o corpo e a mente?

M: A mente purificada é a fiel serva do eu. Ela se encarrega dos instrumentos, internos e externos, e os faz servir a seus propósitos.

P: E quais são seus propósitos?

M: O eu é universal e seus objetivos são universais. Não há nada pessoal no eu. Viva uma vida ordenada, mas não a converta em um fim em si mesma. Isto deveria ser o ponto de partida para a grande aventura.

P: Você me aconselha vir à Índia repetidamente?

M: Se você é sério, não necessita andar por aí. Você é você mesmo onde quer que esteja, e você cria seu próprio ambiente. A locomoção e o transporte não lhe darão a salvação. Você não é o corpo; arrastá-lo de um lugar para outro não o levará a lugar nenhum. Sua mente é livre para passear pelos três mundos, use-a totalmente.

P: Se eu sou livre, por que estou em um corpo?

M: Não está no corpo, o corpo está em você! A mente está em você. Acontecem a você. Existem porque os acha interessantes. A sua própria natureza tem a capacidade infinita de desfrutar. Está cheia de animação e afeto. Ela derrama seu brilho em tudo o que entra no seu foco de consciência, e não exclui nada. Não conhece nem o mal nem a feiúra; ela espera, confia, ama. Você não sabe quanto perde por não conhecer seu próprio ser real. Você não é nem o corpo nem a mente, nem o combustível, nem o fogo. Eles aparecem e desaparecem segundo suas próprias leis.
  Você ama o próprio eu, isso que você é, e tudo o que você faz o faz pela sua própria felicidade. O seu impulso básico é encontrá-lo, conhecê-lo, acalentá-lo. Você ama a si mesmo desde tempo imemorial, mas nunca sabiamente. Use o corpo e a mente sabiamente ao serviço do eu, isso é tudo. Seja verdadeiro para seu próprio eu e o ame absolutamente. Não finja amar os demais como a si mesmo. A menos que os compreenda como um consigo mesmo, não poderá amá-los. Não finja ser o que não é, não recuse ser o que você é. O amor aos demais é o resultado do autoconhecimento, não sua causa. Nenhuma virtude é genuína sem a autorrealização. Quando souber, além de qualquer dúvida, que a mesma vida flui através de tudo o que existe, e que você é esta vida, você amará tudo, natural e espontaneamente. Quando compreender a profundidade e a plenitude do amor a si mesmo, saberá que cada ser vivo e o universo inteiro estão incluídos em seu afeto. Mas, quando você olha para qualquer coisa como separada de você, não pode amá-la porque a teme. A alienação causa o medo e o medo aprofunda a alienação. É um círculo vicioso. Apenas a autorrealização poderá rompê-lo. Vá para ela resolutamente.



De: "Eu Sou Aquilo" - Conversações com Sri Nisargadatta Maharaj (Editora Advaita)


 


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